domingo, 28 de fevereiro de 2010

Perseguição


Sem poder sair de casa, depois das aulas, por causa da chuva e do vento, a Criança e os seus irmãos jogavam consola, viam televisão e liam. O que menos gostava de ler, era o irmão mais novo de Criança. A irmã mais velha lia bastante e a Criança lia ainda mais. Era essa a forma de entrar em Fantasia.
Preparava-se para ler a História Breve da Lua, de António Gedeão, uma peça de teatro que seria apresentada na escola, na Semana da Cultura Cientíca, quando o seu amuleto, que trazia ao pescoço, se iluminou. Era uma pequena medalha, em madrepérola que representava duas imagens, uma feminina e outra masculina, entrelaçadas. Recebera o amuleto das mãos de uma bela Princesa, em troca de a Criança lhe ter salvado a vida há alguns anos atrás. Assim, também a Criança estaria sempre, sempre protegida.
Ora, sempre que este se iluminava, isso queria dizer que algo de estranho se passava em Fantasia. Chamou por Minedu, o dragão de penas, que logo apareceu à janela do seu quarto. A Criança abriu a janela e saltou-lhe para o dorso. Depressa se afastaram, num voo rápido.
O amuleto continuava a brilhar e quando parou, Minedu desceu para o local que o fizera apagar. Ficaram surpreendidos com o que viram. Era a jovem, com o seu vestido em forma de lua, que entrava na peça de António Gedeão, que ali estava. Estava descabelada, enlameada e chorava. Quando se acalmou, contou à Criança e a Minedu que no momento em que regressava a casa depois dos ensaios, sentiu algo ou alguém que a perseguia. Primeiro, começou por andar mais depressa. Logo a seguir, correu e correu e corre e caiu. Os passos estavam cada vez mais perto. Sentia-se à mercê do que quer que fosse. Só esperava que fosse rápido. Pediu mentalmente socorro. Entretanto, quando já se julgava perdida, a Criança e Minedu chegaram e salvaram-na.
A Criança perguntou-lhe se por acaso chegara a ver quem a perseguia. Ela disse que não. Não conseguira ver nada com o medo que sentiu. Depois agradeceu por a terem salvo.
A Criança disse à jovem que a levava a casa . Subiram as duas para o dorso de Minedu, que se elevou nos céus de forma elegante e suave.
Depois de deixarem a jovem em casa, a Criança e Minedu comentaram aquele incidente. Era o segundo acontecimento estranho que acontecia em Fantasia. Mais um mistério para resolver...

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Desapontamento




Era um dos mais belos pores-de-sol de Fantasia. Ou assim parecia ao Dragão de Penas e à Criança. Na verdade, talvez nunca tivessem prestado muita atenção a esse encanto natural.

Já o Unicórnio parecia enfeitiçado com o fenómeno. O seu corpo estacava com elegância e os seus olhos continuavam fixos no horizonte. As cores do céu iam mudando como que por magia. O azul tornava-se de um laranja e dourado inigualáveis. As nuvens pareciam pequenos laivos de algodão com os mesmos tons. E o mar era uma superfície espelhada e colorida.

O Unicórnio continuou a ver o sol pôr-se e a desaparecer a pouco e pouco no mar. Assim que o sol partiu, relinchou. Bateu com o casco da perna direita na terra. Voltou a relinchar. Ergueu-se nas patas de trás. Voltou a relinchar e saiu a galope.

A Criança e o Dragão de Penas, sempre escondidos, acharam que, mais uma vez, algo de grave se passava com o Unicórnio. Algo de incompreensível, muito inquietante, que o fazia reagir com fúria e andar completamente desnorteado por Fantasia. Só que não era fúria o que o Unicórnio sentia. Era desapontamento e tristeza. Outras vezes era felicidade suprema.

Em Fantasia ninguém conhecia ou compreendia a razão para essas mudanças de humor! A Criança montou novamente no Dragão de Penas em direcção a casa.

***


Foto de F Nando

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A Clareira das Decisões


A Criança temeu durante algum tempo pela vida do Unicórnio. Nem ela conseguia acalmá-lo. Não compreendia a razão dessa insitência de pôr a sua vida em risco. Algo de anormal se passava em Fantasia. Para tentar descobrir o que se passava, a Criança convocou alguns dos seres mágicos e fantásticos de Fantasia. Juntos com certeza que iriam descobrir esse mistério.

Gnomos, Duendes, Fadas,Condes, Princesas, Príncipes, o Dragão de Penas, os Pés Gigantes, Feiticeiras, Robots foram chamados à Clareira das Decisões. A Criança, presidente da reunião, deu a palavra a todos. Só que nem todos conseguiam ver ou tinham algumavez visto o Unicórnio. Só quem fosse muito nobre de coração!

Os Gnomos afirmaram perante todos que, desde o dia do acidente, nunca mais o tinham visto. Os Duendes explicaram que só conseguiam vê-lo de madrugada e que a essa hora estava bastante calmo. Os Pés Gigantes confirmaram que à tarde, sempre que passava pelo País dos Pés Gigantes, cantava, relinchava, trotava e corria que num um doido.

Todos os presentes ficaram perplexos com estas últimas informações. As Fadas foram as primeiras a refazer-se desta atitude do Unicórnio e como tinham sido elas que o tinham salvado do acidente, sugeriram que o melhor seria vigiar os movimentos do animal dia e noite. O Dragão de Penas, como podia voar e via muito bem à noite, comprometeu-se a ser o vigilante. Todos concordaram sem reservas.

A Criança agradeceu a presença e colaboração de todos, que logo se despediram e partiram. O Dragão de Penas baixou-se para que a Criança subisse para o seu dorso e voar em direcção e casa. Só que em vez de ir para casa, ambos fizeram uma grande viagem à procura do Unicórnio. Quando se preparavam para desistir, encontraram-no a olhar fixamente para o pôr-do-sol numa das falésias. Estava quieto! Muito quieto!
A Criança e o Dragão de Penas combinaram que o melhor seria esconderem-se e esperar para ver o que iria acontecer... Que mistério!!!

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

No País dos Pés Gigantes

À medida que a fada ia falando, a Criança foi ficando mais tranquila. O Unicórnio tinha sido salvo. Tinha havido algumas complicações, mas nada que as poções mágicas das fadas não pudessem resolver. Mas algo preocupava as fadas. Como é que o Unicórnio se tinha ferido? Uma delas chegou mesmo a sugerir que talvez tivesse sido atacado por alguma criatura desconhecida em Fantasia.

A Criança interveio e disse que isso não acontecia em Fantasia, pois todos os seres e tudo o mais vivia em harmonia. Além disso, ela conhecia bem todos os seus habitantes. O Unicórnio devia ter tido um acidente. Sim era isso. Algumas das vezes que o vira, corria loucamente e sem qualquer noção de perigo.
O Gnomo corroborou as palavras da Criança. Também ele já o vira correr desenfreadamente. Todos desejaram que mais nada lhe acontecesse, nem aos seus irmãos.
Entretanto o tempo foi passando e a Criança, vendo que se fazia horas de regressar a casa, despediu-se de todos, prometendo voltar.
O caminho mais rápido era passando pelo País dos Pés Gigantes. Eram esculturas que se humanizavam sempre que a Criança por ali passava. A Criança de Fantasia tinha esse precioso dom: humanizar as estátuas e não só. Também tinha outros que, agora, não posso desvendar.
Depois de andar muitos passos pela floresta, viu de longe o País dos Pés Gigantes. Assim que se aproximou, os Pés Gigantes adquiriram vida e receberam a Criança com muita alegria. Quiseram saber onde tinha estado, para estar tão longe de casa. A Criança contou-lhes tudo o que tinha sentido naquele dia, por causa do acidente do Unicórnio. Um dos Pés Gigantes confirmou-lhe que o achava muito estranho nos últimos tempos. Fazia umas grandes e arriscadas correrrias. Porém, a partir dali teria, com certeza, mais cuidado antes de se arriscar tanto.
Já a Criança quis saber o que se passava no País dos Pés Gigantes. Um dos Pés contou-lhe que tinham sido visitados por vários seres humanos que os tinham fotografado só por curiosidade. Ouviu-os também comentar que era muito estranho haver ali aquelas estátuas tão estranhas. Não compreendiam o que o seu autor queria com elas. Outro Pé arrematou dizendo que esses visitantes se tinham esquecido de ver este mundo fantástico. Já não pertenciam a Fantasia.
A Criança concordou. Todos concordaram no País dos País Gigantes. Era preciso restabelecer a crença em Fantasia.
A Criança despediu-se, subiu para o dragão de penas e regressou a casa.
***
Nota: Fotos de F Nando

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Histórias e poções mágicas



A Criança não saiu de perto do gnomo enquanto não teve notícias do unicórnio. Para ela todos os seres do universo eram divinos e só a harmonia podia prevalecer em Fantasia. Era necessário proteger os animais, as plantas, os seres fantásticos, os seres humanos. Enfim, era necessário continuarem a protegerem-se uns aos outros, como acontecera até ali. Não imaginava a vida de outra forma.
O tempo tardava em passar. O gnomo, vendo a Criança tão impaciente, contou-lhe a história do "João Pateta", do autor dinamarquês Hans Christian Handersen. A Criança riu-se muito com os belos presentes que o João Pateta recolhia e levava para dar à princesa: uma gralha morta, a parte de baixo de um tamanco e lama. Ainda se riu mais quando o João Pateta respondeu com inteligência aos desafios da princesa, apresentando como sugestão ou argumento cada uma das prendas que levava.
Ainda se riu mais quando João Pateta atirou com lama à cara do mestre dos escribas para que nada daquela "entrevista" se soubesse. A princesa gostou dele, casaram e foram rainha e rei. Os dois irmãos de João Pateta é que não deviam ter gostado muito.
Ainda passaram duas longas horas, assim pareceu à Criança, até que as fadas regressaram ao palácio. Estavam sujas e despenteadas, porém felizes. O unicórnio ia sobreviver e, depois de se recompor com as diferentes poções mágicas, todos os que tivessem sorte iriam vê-lo a passear pelo bosque. Só alguns tinham esse privilégio e a Criança era uma delas.
*******

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

«A Maior Flor do Mundo»

Cansada de brincar nas traseiras da casa com os irmãos, a Criança avisou-os que ia visitar as fadas, pois já há muito tempo que não o fazia. Avisou também os pais para que estes não se assustassem quando dessem pela sua falta.

Embrenhou-se na floresta que naquela altura do ano, o Outono, era uma autêntica aguarela de tons. As árvores tornavam-se policromas: entre o amarelo velho, o castanho, o vermelho, um restinho de verde escuro tudo parecia a mais pura harmonia do Universo. Como as folhas caíam à menor brisa ou mesmo sem ela, o chão ficava atapetado e macio.

A Criança gostava de admirar a floresta nesta altura do ano. Tudo se preparava para entrar no Inverno onde tudo estaria mais despido e faria mais frio. Com certeza que nevaria. E aí a paisagem e as brincadeiras seriam outras. Fantasia era ainda mais Fantasia!

Quando a Criança chegou ao palácio das Fadas, disseram-lhe que elas tinham ido salvar um unicórnio que caíra numa ravina e estava em perigo de vida. A Criança quis ir ter com elas, porém um sábio gnomo aconselhou-o a não ir. Ele não sabia ao certo o local onde se encontravam e podia ser perigoso. Sugeriu-lhe que fossem até à bibloteca e, assim, enquanto esperava, podia ler um livro.

A Criança, que já lera muitos e muitos livros, pediu-lhe uma sugestão. O gnomo subiu a escada para chegar a uma das estantes e retirou um livro intitulado A Maior Flor do Mundo. Assim que o entregou à Criança, ela explicou-lhe que já tinha lido aquele livro e que era dos mais belos que tinha lido. Como o gnomo ainda não tinha lido aquela história, a Criança contou-lha.

Um menino sai da sua aldeia e vai ver mundo. Afasta-se seguindo o curso do rio, viajando até Marte, apesar da sua tenra idade, e já em terra descobre uma flor.
A flor que estava sequiosa. Não havia água ali perto! A flor é salva graças ao esforço do menino que faz muitas caminhadas, trazendo na concha das mãos, o precioso líquido para matar a sede à flor que se torna viçosa e linda. O seu amor pela Natureza é inabalável pois no fim desta aventura os seus pés ficam a sangrar. Já muito
cansado adormece e a flor deixa cair uma bela pétala para o proteger.
Quando os pais e vizinhos o encontram, pois já o julgavam perdido, é levado para a aldeia onde é considerado um herói.

O gnomo enterneceu-se com a história e quis saber o nome do seu autor. A Criança disse-lhe que José Saramago era o escritor. E mais! No início da narração da história,Saramago confessa que não sabe escrever histórias para crianças, que não tem paciência, que tem de se utilizar uma linguagem simples.
O gnomo disse que a história que acabava de ouvir, contradizia tudo o que José Saramago dissera. A Criança reforçou que aquele tinha sido o único livro infanto-juvenil que este escritor escrevera, contudo era uma obra prima. Aliás, até já lho dissera pessoalmente.
Quando? - quis saber o gnomo.
Num destes dias, em que José Saramago passeava por Fantasia!
*******
Esta história foi adaptada para cinema./ Espanha 2006/ Animação/ 10m
http:/cinema.sapo.pt/filme/a-flor-mais-grande-do-mundo

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Harmonia



A Criança de Fantasia tinha toda a liberdade para andar por todo esse Mundo. Na verdade, ele nascera por causa dela. E era aí que havia de viver muitas e muitas aventuras.


Gostava de brincar na floresta, nas clareiras, nos riachos, à beira mar. Sim, em Fantasia havia também um Oceano de águas límpidas. A Natureza era completamente intacta. A mão do homem tivera o cuidado de pensar os espaços que ocuparia. Tudo fora bem planeado. Harmonia era a palavra de ordem.

Como a Criança se divertia com os seus irmãos! Brincavam ao esconde-esconde; ao lencinho; ao pião. Nas tardes de sol, andavam de pónei. E muito ao fim do dia, viam unicórnios lindíssimos! As fadas e os gnomos eram os confidentes de Criança-


Os pores-do-sol em Fantasia eram maravilhosos. Ver o sol descer no horizonte que mais parecia uma paleta de cores do amarelo dourado suave, ao laranja, ao violeta e rosa era um milagre da natureza. A luz que ia desaparecendo, dava lugar a um azul luminoso e mais tarde, quando desaparecia, ao azul-noite.
Como passariam as noites? Sim, em Fantasia não havia energia eléctrica...
*******
Nota: fotos de F Nando